Gerenciar perecíveis no varejo alimentar é uma corrida contra o tempo e perder essa corrida custa caro. Segundo a ABRAPPE (Associação Brasileira de Prevenção de Perdas), até 58% das perdas das lojas vêm justamente dessa categoria, que concentra frutas, legumes, padaria, carnes e rotisseria.
No episódio 136 do PDV Podcast, eu, Gustavo Carrer, e Fernanda Vasconcelos conversamos com Darlan Moraes, diretor da Leafio soluções e especialista em inovação e tecnologia, sobre como a inteligência artificial preditiva e outras ferramentas digitais estão mudando a forma de lidar com essa área crítica do varejo.
Os erros mais comuns na gestão de perecíveis
Grande parte das perdas nos perecíveis ainda vem de práticas ultrapassadas. Muitos supermercados continuam baseando suas compras no “feeling” dos compradores ou em planilhas simples, sem previsões reais de consumo. Como explicou Darlan, essa falta de precisão faz com que o comercial, mesmo bem-intencionado, trabalhe com “achismos”.
“O back-end está muito baseado no Excelou no feeling do comprador, em margens de min-max que são muito pouco afinadas.” — Darlan Moraes
Pior: em muitos casos, nem planilhas são usadas. Essa falta de precisão leva a rupturas, excessos de estoque e, principalmente, a perdas financeiras significativas.
Esse é um dos pontos mais críticos: sem processos estruturados, o varejo acaba correndo atrás do prejuízo em vez de antecipar demandas.
Inteligência artificial preditiva: previsibilidade e lucratividade no varejo
A inteligência artificial preditiva já é realidade no varejo alimentar e vem se tornando o grande divisor de águas na gestão de perecíveis. Diferente da IA generativa, que cria conteúdos, a preditiva cruza dados históricos e em tempo real para prever consumo e comportamento de cada SKU (Stock Keeping Unit ou Unidade de Manutenção de Estoque, em português) em cada loja, considerando variáveis como localização, perfil do público e até sazonalidade. Isso significa sair do modelo ultrapassado de médias ponderadas.
“Você tem aí à disposição hoje no mercado algoritmos que te dão predição diária por localização de quanto aquele produto vai ser consumido. Não adianta ter média ponderada, para perecíveis é um tiro no pé.” — Darlan Moraes
Um dos diferenciais dessa tecnologia é calcular o Remaining Shelf Life (RSL), ou seja, o tempo de vida útil na prateleira, que pode variar conforme o produto e a forma como é vendido. O mamão, por exemplo, pode ser comercializado in natura, picado em bandeja ou transformado em suco, cada formato com demandas e prazos de validade distintos.
Com algoritmos como o WMAP, o sistema aprende essas curvas de consumo e gera previsões que vão de 12 semanas a até 12 meses, permitindo ao varejista planejar estoques, compras e promoções com muito mais assertividade.
Na prática, isso representa um salto de eficiência: o centro de distribuição e as lojas passam a operar de forma integrada, com dados consistentes orientando a reposição, a precificação e até a destinação de produtos para consumo interno (como padarias e restaurantes dentro dos supermercados). E o impacto é direto: mais previsibilidade, menos perdas e maior lucratividade.
Estratégia promocional baseada em dados, para reduzir perdas e aumentar vendas
Outro ponto de destaque da conversa foi o papel das promoções. Tradicionalmente vistas como soluções de última hora para escoar estoques, elas ainda geram frustração: segundo dados da Nielsen citados por Darlan, 80% dos varejistas não estão satisfeitos com os resultados de suas promoções.
Com tecnologia, esse quadro muda. É possível identificar em tempo real quais itens estão próximos do vencimento e migrá-los de forma integrada para campanhas promocionais, seja no tabloide, na loja física ou até nas redes sociais.
“Hoje em dia, com a tecnologia, você tendo essa previsibilidade onde você sabe que aquele produto vai ter uma vida útil muito curta, você pode partir para uma promoção e migrar esse SKU para uma área promocional.” — Darlan Moraes
Esse ponto é crucial porque, como destacou Darlan, com tecnologia, a indicação de produtos próximos ao vencimento e a integração direta com campanhas digitais ou de tabloide tornam o processo mais assertivo.
Caso real com a IA: resultados já comprovados
Um exemplo citado por Darlan é o do Grupo Camilo de Alimentos (GCA), que reúne as bandeiras Camilo Atacadista e Camilo Supermercados, com 9 lojas na região noroeste do Paraná e mais de 15 mil SKUs em estoque. A rede decidiu modernizar seus processos ao migrar para a solução de otimização de estoque da Leafio AI, plataforma internacional especializada em inteligência artificial para o varejo. A adoção da ferramenta trouxe um impacto significativo justamente por permitir uma sintonia mais precisa, algo que o sistema anterior não conseguia oferecer.
Isso significa mais precisão na previsão de demanda, automação na geração de ordens de compra e maior eficiência na gestão de perecíveis, especialmente em categorias como frutas, legumes e padaria. O resultado aparece não apenas na redução das perdas, mas também no ganho de rentabilidade e na liberação de capital de giro.
“O que eu tenho como já comprovado com clientes que a gente trabalha é que sobra mais dinheiro em cima da mesa e o delta de abertura da sua próxima loja ou o delta tempo de abertura da sua nova padaria, ele vai diminuir.” — Darlan Moraes
O case dos Supermercados Camilo mostra como a tecnologia aplicada ao back-end impacta diretamente a experiência do cliente no front-end. Com operações mais afinadas, o grupo acelera seu crescimento sustentável e ganha fôlego para expandir com segurança em um mercado cada vez mais competitivo.
Dica para varejistas: investir também em back-end
Para Darlan, a principal recomendação é direcionar investimentos também para o back-end, que muitas vezes não recebe a mesma atenção do front-end (a experiência direta com o consumidor). O resultado disso, são perdas silenciosas que corroem a rentabilidade no fim do dia. Investir em inteligência artificial, automação e integração entre loja e centro de distribuição garante não só eficiência operacional, mas também uma experiência de compra superior para o consumidor final:
“Como o back-end não é visto ali pelo consumidor, ele acaba sendo um pouco negligenciado. Então, acho que a grande dica é olhar com bastante atenção e entender como otimizar cada vez mais esses processos. A tecnologia é fundamental para que o varejista tenha maior rentabilidade.” — Darlan Moraes
Quem começar cedo nesse movimento terá vantagem competitiva. Quem adiar, encontrará uma concorrência já estabelecida, operando de forma mais precisa e lucrativa.
O futuro da gestão de perecíveis: tecnologia, estratégia e eficiência unidas
O episódio 136 do PDV Podcast mostra que o futuro da gestão de perecíveis passa por três pilares inseparáveis: tecnologia, estratégia e eficiência operacional. A inteligência artificial preditiva deixa de ser promessa para se tornar prática, oferecendo previsibilidade real e impacto direto no resultado das lojas.
Como reforçamos na conversa, dados só têm valor quando se transformam em decisões inteligentes e ações rápidas. E, no caso dos perecíveis, essas ações precisam ser tomadas todos os dias, porque cada minuto faz diferença entre perder ou ganhar dinheiro no varejo.