A sucessão é, talvez, um dos maiores desafios para empresas familiares, especialmente no varejo, onde o dia a dia exige decisões rápidas, inovação constante e um equilíbrio delicado entre legado e futuro.

No episódio 134 do PDV Podcast, que conduzi ao lado de Adriano Sambugaro, recebemos dois representantes da nova geração de varejistas: Francielly Crestani, do Grupo Crestani, que reúne a rede de supermercados VIPI e a loja de atacado e varejo Bonno, e Rogério Tridapalli Junior, dos Supermercados Carol.

Eles também são coordenadores do Comitê de Sucessores da ACATS (Associação Catarinense de Supermercados), e no decorrer do episódio falaram sobre a preparação gradual, o papel da governança e a importância do diálogo entre gerações para garantir a perenidade dos negócios.

Em nosso bate-papo, vieram à tona os dilemas, acertos e aprendizados do processo sucessório no setor supermercadista, com exemplos reais de empresas que estão enfrentando (e superando) esse desafio de forma estruturada e humana. Em um país onde 90% das empresas são familiares, mas menos de 12% chegam à terceira geração, o episódio mostra que sucessão é uma construção contínua.

Governança e diálogo entre gerações: a chave para não travar a inovação no varejo familiar

Um dos principais temas que abordamos foi o equilíbrio entre o respeito pela história da empresa e a necessidade de renovação. Essa é uma tensão comum na sucessão familiar, e o que ouvimos foi que o caminho, passa pelo diálogo.

“O meu pai é extremamente ativo na empresa e conversamos muito sobre tudo, porque tem coisas que antigamente davam certo, mas que agora não. É muito diálogo e muita discussão, no bom sentido. [...] A gente consegue chegar em um equilíbrio, mesmo que eu não concorde 100%, fazemos dar certo para o bem da empresa.” — Francielly Crestani

Outro tema central do episódio foi a importância da governança na sucessão familiar. Os convidados deixaram claro que a governança não precisa necessariamente começar com um conselho estruturado, ela pode nascer de definições claras de papéis e responsabilidades, somadas à convivência próxima dos fundadores e sucessores.

No caso do Supermercados Carol, Junior destacou uma abordagem prática para distribuir responsabilidades e preparar os sucessores de forma gradual.

“A maneira que a gente achou para fazer essa sucessão ir acontecendo de maneira gradativa foi colocar cada um dos nove (integrantes da nova geração) em uma função(...) E no meio disso vai nascer o líder.” — Rogério Tridapalli Junior

A empresa hoje tem nove membros da segunda geração atuando em diferentes setores: marketing, RH, comercial, fiscal, TI, manutenção e outros. Para Júnior, mais do que definir um nome, o foco está em construir uma visão comum.

Muitos negócios familiares ainda não formalizaram estruturas de governança, mas já reconhecem sua importância para o futuro. Governança não é um “luxo corporativo”, é o que garante que a sucessão ocorra sem rupturas e sem colocar em risco a operação.

Herdeiros fora do negócio: como lidar com a participação societária

Outra pergunta que gerou reflexões importantes foi sobre a atuação (ou não) dos herdeiros que possuem participação societária, mas não estão no dia a dia do negócio. Esse é um ponto sensível para muitos negócios familiares. E, embora nem sempre conflituoso, pode gerar tensões.

Junior explicou que, nos Supermercados Carol, esse é um ponto bem resolvido:

“Essas pessoas que não estão dentro do negócio acabam não participando muito das conversas. [...] Esse diálogo acaba sendo bem tranquilo e a decisão acaba ficando com quem está de fato dentro do negócio.” — Rogério Tridapalli Junior

Do ponto de vista da gestão, essa clareza é essencial. Como comentei no episódio, o conflito muitas vezes surge da sobreposição de expectativas: de um lado, o sócio que atua e precisa tomar decisões rápidas; do outro, um sócio que não participa da operação, mas pode ter poder de voto ou influência. Estruturar esse equilíbrio entre respeitar a sociedade e reconhecer o envolvimento prático é uma das chaves para evitar ruídos internos.

Comitê de Sucessores da ACATS: uma rede de apoio para quem está assumindo o bastão

Criado dentro da ACATS, o Comitê de Sucessores tem sido uma plataforma fundamental para troca de experiências e desenvolvimento de lideranças no varejo catarinense. Trata-se de uma iniciativa que busca justamente apoiar e preparar a nova geração de líderes do varejo e é coordenado pelos dois convidados.

“O comitê de sucessores da ACATS tem um propósito que é muito claro. Um espaço de troca, aprendizado e fortalecimento entre pessoas que estão assumindo ou se preparando para assumir esse papel de liderança. E a gente percebe que, embora cada empresa tenha a sua realidade, tamanho, número de lojas, os desafios são muito parecidos. Então, é conciliar tradição e inovação.” — Francielly Crestani

O comitê oferece desde formações com instituições nacionais e internacionais até visitas técnicas a empresas inovadoras. Essa profissionalização é um diferencial que pode tornar o processo de sucessão menos intuitivo e mais estruturado.

Varejo e sucessão familiar: resiliência, pessoas e legado

O episódio deixou evidente que sucessão familiar no varejo vai muito além de uma troca de cargos. Trata-se de um processo contínuo de construção coletiva, que exige escuta, respeito pelas origens, preparo emocional e coragem para liderar o novo sem abandonar o legado.

Iniciativas como o Comitê de Sucessores da ACATS, coordenado por Francielly Crestani e Rogério Tridapalli Junior, são fundamentais nesse caminho. O grupo promove encontros, trocas de experiências, formações especializadas e visitas técnicas, criando um ambiente seguro e colaborativo para quem está assumindo o bastão nas empresas familiares catarinenses.

Se você está vivendo esse processo na sua empresa, recomendo ouvir o episódio completo do PDV Podcast e entrar em contato com a ACATS para saber mais sobre o Comitê: www.acats.org.br. A sucessão familiar não precisa ser um ponto de ruptura, ela pode (e deve) ser o início de um novo ciclo de crescimento no seu varejo.